27/4/2018 0 Comentários "Comunicar não é opção"Em Portugal, a formação médica não privilegia a comunicação. No entanto, no seu quotidiano qualquer médico sente necessidade de dominar algumas competências a esse nível. Mais em determinadas especialidades do que outras, é certo. Destaquemos aqui o campo da saúde pública. A comunicação pode ser pensada em diferentes níveis: interpessoal, organizacional, mediática... Aí, um profissional da saúde encontra desafios de vária ordem, sem que transporte consigo ferramentas formativas que o habilitem a apresentar respostas ponderadas e refletidas. Reage-se de forma intuitiva. Umas vezes com boas performances, outras com resultados calamitosos... Olhando para a vida de todos os dias de um médico de saúde pública, reparamos que a respetiva rotina profissional se estrutura em diálogo com os utentes. De idade diferenciada, de formação diversa, de meios distintos. Em cada situação, impõe-se uma situação comunicativa adaptada ao contexto, ainda que atravessada por registos comuns de fala. Convém nunca esquecer que grande parte da nossa comunicação se faz de modo não-verbal. No gabinete médico, todos os gestos de um profissional de saúde contribuem para criar uma determinada relação com o utente. Claro que há pessoas mais críticas do que outras, mas ninguém ficará indiferente a uma postura de arrogância, de alheamento ou de urgência para passar a outra consulta... Se o registo de voz e o vocabulário escolhido interferem no modo como se interpreta o que o médico diz, o olhar assume igualmente uma importância decisiva. Hoje os médicos têm uma enorme pressão para registar tudo digitalmente e essa tarefa subtrai-lhes tempo para olhar com atenção quem chega ao seu gabinete. Ou simplesmente para conversar olhos-nos-olhos. Algo muito simples, mas frequentemente negligenciado. Há também que ter em conta que a saúde pública se desenvolve em rede e isso implica uma atenção particular à comunicação interna dentro de uma estrutura que integra diferentes patamares de decisão. É preciso, pois, pensar em canais por onde fluam informações pertinentes para um público interno que, em diferentes lugares, contribui para o bom funcionamento daquela instituição. É também imperioso planear uma comunicação com o exterior: com aqueles que usam os serviços e, também muito importante, com a comunidade onde determinada instituição está implantada. A promoção da saúde não se faz apenas dentro de um gabinete médico ou num centro de saúde. Antes se desenvolve em articulação permanente com diferentes atores sociais, frequentemente em contexto de proximidade. Outra dimensão da comunicação diz respeito à relação com os meios de comunicação social. Qualquer leitura do espaço público contemporâneo nunca poderá estar completa sem integrar os média, nomeadamente na sua vertente jornalística, de indiscutível protagonismo e centralidade sociais. Hoje, a informação mediática assume-se como mecanismo privilegiado na transformação dos factos sociais em factos públicos, operando nas sociedades atuais as maiores mudanças qualitativas do mapa social. Como vários estudos internacionais e também desenvolvidos no nosso país mostram, os meios de comunicação social privilegiam muitíssimo o campo da saúde. Umas vezes destacando situações de crise, outras agendando temas que ajudam a promover a saúde junto dos cidadãos. A uns e a outros, os profissionais de saúde devem prestar atenção, dotando-se de conhecimentos e competências práticas que lhes permitam agir com eficácia em contextos diversos. No caso das situações de risco, é preciso fazer chegar aos jornalistas uma informação regular, clara e pedagógica. Quando os casos ganham amplitude, o silêncio das entidades oficiais implica a multiplicação de fontes paralelas que vão semeando rumores e ampliando o pânico. Por isso, se impõe que, de imediato, se nomeiem pessoas responsáveis por esse tipo de comunicação. Que falem de modo direto e ajudem a população a ter comportamentos adequados. Mas o noticiário da saúde não se compõe apenas de uma agenda estruturada pelo ângulo negativo. Há igualmente uma noticiabilidade positiva. Que importa desenvolver mais. A este nível, são necessários profissionais de saúde mais proactivos a comunicar o que fazem. E a fazê-lo de um modo mais eficaz. Porque só assim conseguem reter alguma atenção num ambiente que se satura de mensagens de todo o tipo. Felisbela Lopes
Professora associada com agregação do Departamento de Ciências da Comunicação da Universidade do Minho.
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