Nome
Ana Regina Serra Sá 1) Que estágio fizeste e onde? Realizei os primeiros 4 meses do meu estágio de investigação no Design and Health Lab, Department of Architecture, Built environment and Construction Engineering (DABC) do Politecnico di Milano (POLIMI), em Itália, sendo que cumpri os últimos 2 meses, posteriormente, no INSA. No âmbito da unidade curricular de Metodologias de Investigação em Saúde Pública II, do Curso de Especialização em Saúde Pública (CESP), sob a orientação do Prof. Dr. Baltazar Nunes e com o apoio da Dra. Mafalda Sousa Uva do Departamento de Epidemiologia (DEP), do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), desenvolvi um protocolo de investigação que pretendia avaliar os aspectos de Saúde Urbana dos Planos Diretores Municipais e a sua associação com a saúde. No entanto, este teve de ser adaptado e acabei por estudar a associação entre a caminhabilidade ao nível da freguesia e a hemoglobina glicosilada. O grupo de investigação do POLIMI com quem trabalhei apresentou-me várias ferramentas que tinha disponíveis para avaliação do espaço urbano, e o protocolo foi também desenvolvido com base na ferramenta que melhor se adaptava aos objetivos do meu trabalho, sempre em conjunto com os dois grupos de trabalho (POLIMI e INSA). 2) Como foi o processo de candidatura? Não houve propriamente um processo de candidatura. Durante uma European Public Health Conference fiquei a conhecer o Professor Capolongo, um arquiteto com doutoramento em Saúde Pública, bem como outros colaboradores da secção de Urban Health da European Public Health Association, que formavam um grupo de investigação do POLIMI, mais especificamente do Design and Health Lab. Depois, durante uma outra conferência em Milão, abordei-os para perceber se teriam disponibilidade para me receber em estágio. Aceitaram logo à partida, mas havia necessidade por parte do POLIMI de criar um protocolo com a instituição portuguesa a que eu pertencia, que no meu caso foi a Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), já que eu estava ainda a frequentar o CESP. Com o apoio do Professor Paulo Sousa e da Professora Carla Nunes o protocolo foi formalizado e, agora que está já estabelecido, será à partida mais fácil para outros internos que frequentem a ENSP realizarem futuros estágios no POLIMI. Para além do protocolo foi necessário, tal como para outros estágios, pedir autorização à Comissão Regional do Internato Médico (CRIM) e à Ordem dos Médicos (OM), o que aconselho fazer com antecedência, pois obter estas respostas pode levar algum tempo. No meu caso, comecei a tratar destes pedidos em novembro de 2019 para realizar o estágio em junho de 2020. No entanto, a pandemia atrasou todo o processo e acabei por só realizar o estágio entre abril e setembro de 2021. Por fim, para além de serem necessários os documentos usuais (como o cartão de cidadão), fiz também um seguro de danos pessoais (exigido pelo POLIMI) e candidatei-me previamente a uma bolsa do Sindicato Independente dos Médicos (SIM). 3) Como descreverias o dia a dia a estagiar no POLIMI? A minha semana de estágio típica incluía um a dois dias de teletrabalho e os restantes presenciais, em que acabava por participar em várias reuniões de diferentes projetos. A maioria destas reuniões era conduzida em italiano, pelo que considero que seja importante ter algum conhecimento da língua. Apesar de a comunicação em inglês ser possível é, por vezes, difícil. Um dos aspetos que considero ter sido dos mais importantes para o dia a dia foi o grupo de investigação com que trabalhei, que foi muito acolhedor e mantinha um ambiente de trabalho muito bom e descontraído. Para além de mim, o grupo era constituído por três professores, três arquitetos doutorados a trabalhar como investigadores e três doutorandos (dois arquitetos e um médico). Tal como eu, existiam também outros estrangeiros no grupo, nomeadamente norte-americanos, alemães e chineses. 4) Achas que foi uma experiência enriquecedora a nível profissional? Que atividades/projetos incorporaste durante o estágio? Relativamente ao meu projeto de investigação, trabalhei a variável da caminhabilidade ao nível da área. Fiz a revisão de literatura para descrever o background teórico, de acordo com o qual desenvolvi a metodologia e contribuí para a construção do índice de caminhabilidade, sempre em colaboração com o grupo de investigação do POLIMI e com o INSA. Para além do meu projeto, pude observar o desenvolvimento de outras ferramentas pelo grupo de investigação, nomeadamente para avaliação da sustentabilidade em meio hospitalar e para avaliação do design inclusivo. Assisti também a diversos webinars, aulas e à apresentação de teses de doutoramento. Participei ainda em reuniões de arquitetura para a construção de um hospital em San Marino e na realização de um diagnóstico de situação para um projeto sobre envelhecimento ativo e saudável, entre outros projetos. Pude também aperceber-me do contraste entre o funcionamento dos cuidados de saúde primários em Itália e em Portugal, sendo que estruturalmente estão muito menos desenvolvidos no primeiro caso, mas com vários projetos piloto em curso para a sua expansão. Uma das experiências mais enriquecedoras que tive foi observar de perto o planeamento coordenado e multidisciplinar dos centros de vacinação em massa para a COVID-19 na região lombarda, sobre o qual escrevi um artigo já publicado na newsletter da Saúde+Pública. Uma das atividades mais interessantes em que participei foi o Curso de Erice. Se estagiarem no POLIMI, aconselho-vos a participar. Este curso é realizado anualmente na cidade de Erice, na Sicília, na Escola de Epidemiologia, e no meu ano o tema foi “Rethinking cities and living spaces for public health purposes, according to COVID-19 lessons”. É um curso dirigido a médicos internos de saúde pública, mas que além de médicos de saúde pública reúne também engenheiros, arquitetos, epidemiologistas, entre outras disciplinas. Contribuí ainda para a realização de três episódios para o podcast da newsletter da Saúde+Pública, onde descrevo várias áreas de trabalho do Design and Health Lab. O primeiro intitulado “mental health and inclusive design”, o segundo “urban health and walkability” e o terceiro “hospital design and indoor air quality”. 5) Quais as maiores aprendizagens que retiras deste estágio? Como gosto de referir, o facto de se ter tratado de uma experiência de trabalho multidisciplinar é sem dúvida muito importante e traz imensos ganhos para o futuro. Ajudou-me a perceber como várias disciplinas (engenheiros, arquitetos, médicos, geógrafos, etc.) se podem conciliar e cooperar em tarefas conjuntas para atingir objetivos para a saúde da população, bem como o papel que cada uma desempenha individualmente neste esforço conjunto. 6) Tiveste oportunidade para conhecer melhor outros colegas? O que achaste da cidade? O grupo do POLIMI com que trabalhei organizava vários jantares, festas, viagens, e acabámos por ficar bastante amigos. O facto de sermos um grupo pequeno acabou por ser muito bom para criar uma ligação mais forte. Milão não é a cidade italiana mais típica, mas tem muita oferta cultural e social. Eu ia semanalmente ao teatro, concertos, feiras... Está localizada no norte de Itália, que é bastante mais organizado que o sul, tem transportes públicos que funcionam muito bem. Tem vários ginásios e muita vida social (aperitivos diários). O clima não é muito simpático (bastante frio de inverno, sempre cinzenta, mas com casas aquecidas, e muito calor no verão). O custo de vida é alto – a renda de um quarto em casa partilhada pode rondar os 500€. Outro aspeto positivo é o facto de haver vários voos diretos diários de Portugal para Milão a baixo custo (principalmente do Porto). Acabei por visitar várias localidades ao redor e, nomeadamente, fazer snowboard. Aconselho a visitar localidades como Como, Bellagio, Lecco, Lago di Garda, Sirmione, ou ir de bicicleta até à Certosa di Pavia. Para quem gosta de desportos de neve, podem ir para os Dolomiti ou Cervinia, ou com o trenno della neve ou bus della neve podem adquirir packs diários de viagem + skipass. Se tiverem interesse, a associação de estudantes do POLIMI organiza excursões à Bienal de Arquitetura de Veneza. A comida típica de Milão é a Cotoletta com arroz de açafrão. No fundo, é um panado pelo qual vão pagar 25€ mas vale a pena provar. Acho importante referir que um dos motivos da escolha da cidade foi pessoal, apesar de eu já ter interesse profissional neste tema da Saúde Urbana há vários anos Foi bom para mim conseguir conciliar estes dois aspetos importantes da minha vida. 7) O XIII Encontro Nacional de Médicos Internos de Saúde Pública (ENMISP), que terá lugar nos dias 1 a 3 de junho, tem como tema central a sustentabilidade da saúde. De que forma achas que a caminhabilidade contribui para uma saúde sustentável? Caminhabilidade refere-se ao quão uma área é favorecedora da caminhada e já demonstrou ter impacto na atividade física dos indivíduos. De um modo geral, a caminhabilidade de uma área tem um importante impacto na promoção do transporte ativo, que por sua vez promove a atividade física e, consequentemente, a saúde. Por outro lado, substitui a utilização de meios de transporte mais poluentes, contribuindo, por exemplo, para a diminuição da poluição do ar e do ruído e, paralelamente, para a redução da utilização de espaço dedicado aos carros (podendo ser convertida noutras utilizações). 8) Quais são alguns dos aspetos centrais em planeamento urbano para promover saúde sustentável? Que aspetos são negligenciados? O que tem de mudar? Os aspetos como qualidade do ar e água são geralmente os mais tidos em conta. Outros, nomeadamente relacionados com a energia, conforto visual ou conexão social, são mais frequentemente negligenciados. A mobilidade, por outro lado, é um tema que tem estado a ganhar protagonismo. No entanto, mesmo em termos de organização do espaço, ainda não existe uma grande atenção a características mais relacionadas com a caminhabilidade, como o mix de uso dos solos, a densidade residencial e a conectividade das ruas. É importante ter noção que se melhorarmos estas características iremos diminuir a distância a ser percorrida até chegar aos destinos e, desta forma, iremos promover o transporte ativo (a caminhada, a bicicleta, etc.). Os resultados do nosso estudo de investigação mostraram que, de facto, as freguesias portuguesas possuem maioritariamente um índice de caminhabilidade muito baixo. 9) Como é que nós, enquanto internos de saúde pública, podemos enriquecer a nossa formação nesta área? Qual é aqui o papel da saúde pública? Devemos, sem dúvida, trabalhar com grupos e instituições cujos projetos se foquem nesta área, bem como participar em congressos, conferências e cursos relacionados. Devemos procurar integrar projetos que trabalhem este tema e, no fundo, mostrar interesse e “aparecer”. Eu, por exemplo, peço sempre para participar nos pareceres às revisões do Plano Diretor Municipal (PDM) no meu Agrupamento de Centros de Saúde (ACES). Nós podemos contribuir com evidência científica e conjugar isso com o trabalho das equipas locais pode ser muito útil. Quando procuramos contribuir e ajudar, as pessoas começam realmente a perceber que temos valor a acrescentar. 10) Links de interesse: Caso tenham alguma dúvida ou queiram discutir algo mais sobre o meu estágio, deixo-vos o meu LinkedIn e o meu e-mail ([email protected]). Podem também ver uma apresentação que fiz sobre o meu estágio de investigação.
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1) Nome, ACES de colocação, Ano de internato, respetivo Estágio do internato
Mariana Perez Duque, USP Porto Ocidental, 4º ano, estágio opcional. 2) Instituição, Cidade e País Universidade de Cambridge, Cambridge, Reino Unido. 3) Como foi o processo de candidatura? Não há absolutamente nenhum processo de candidatura. Há um contacto/discussão de projeto com o proposto orientador (como o exemplo da tese de mestrado em Medicina). 4) Quais foram as tuas funções? Fui investigadora/cientista visitante de um grupo de investigação em epidemiologia de doenças infeciosas. 5) Achas que foi uma experiência enriquecedora a nível profissional? Quais as maiores aprendizagens? Aprendi muito com o meu orientador e colegas em métodos, sobretudo a nível computacional, biologia, genética e ecologia. Tive oportunidade de aprofundar conhecimentos em dinâmicas de doenças, desde o seu nível genético, aos níveis mais macro, epidemiológico e ecológico, percebendo todo o ciclo de uma doença. 6) Tiveste oportunidade para conhecer melhor outros colegas e a cidade onde decorreu o evento? O grupo de investigação onde estive reúne todas as semanas para discutir temas e linhas de investigação, bem como reúne com outro grupo de investigação em zoonoses semanalmente. Fora do ambiente académico havia também todas as semanas eventos sociais, onde todos se reuniam para confraternizar. 7) O que achaste de Cambridge? Cambridge é académica e empresarial com muitos eventos e oportunidades de colaboração. A cidade fica localizada no Cambridgeshire, a nordeste de Londres (60 minutos de comboio da estação de Kings Cross). É plana e a maioria das pessoas circula de bicicleta ou a pé, há muitos parques e zonas verdes. Achei muito estimulante, bucólica e pitoresca. 8) O que mais te marcou nesta experiência? O ambiente de máxima responsabilidade com máxima confiança. O companheirismo dos meus colegas, que se tornaram amigos. 9) Que conselhos darias a outros internos que gostassem de ter uma experiência semelhante? A todos os colegas que gostem da área de investigação, identifiquem uma área específica que gostem e que queiram aprofundar, pesquisem que grupos a nível mundial são pioneiros nessa área e contactem os líderes desses grupos para discutir um projeto/estudo. |
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