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15/10/2025 0 Comentários Surto de Ébola no RDCVacinação reativa já no terreno; OMS e parceiros montam ponte aérea e laboratório móvel para travar transmissão da infeção O Ministério da Saúde da República Democrática do Congo (RDC) declarou, a 4 de setembro de 2025, um surto de doença por vírus Ébola na zona de Bulape, província do Kasai. Até 25 de setembro, foram confirmados 47 casos e 25 mortes, resultando numa letalidade de 53,2%. Entre as vítimas mortais contam-se cinco profissionais de saúde do hospital onde o primeiro caso foi tratado: três técnicos de laboratório e duas enfermeiras. Na última semana, o surto iniciou uma tendência decrescente. Paralelamente, as autoridades de saúde congolesas acompanham 1180 contactos e reforçam as medidas de prevenção e controlo, incluindo vigilância, tratamento e vacinação. Características da Doença e Vias de Transmissão O ébola é uma doença rara, mas frequentemente fatal em humanos. A transmissão humana do vírus Ébola pode ocorrer através do contacto direto da pele e das mucosas ocular, nasal, oral e genital com o vírus. A transmissão pessoa-a-pessoa geralmente verifica-se por contacto com sangue, ou outros fluidos biológicos de pessoas infetadas, mortas ou vivas, superfícies, objetos ou roupas contaminadas com fluidos de doentes ou pessoas que morreram com Ébola ou contacto sexual não protegido com sémen de homens, que recuperaram da doença. A transmissão de animais para humanos pode ocorrer através de contacto direto com sangue e outros fluidos corporais de animais portadores da doença, ingestão da carne de animais infetados ou a manipulação de animal infetado. O risco de infeção é maior entre profissionais de saúde que tenham contacto próximo com doentes com Ébola ou coabitantes de um doente infetado. Origem do Surto e Resposta Segundo o relatório de situação da OMS África, de 15 de setembro, análises genómicas indicam 99,5% de similaridade com a estirpe Yambuku-Mayinga (1976), apontando, deste modo, para um novo spillover zoonótico, sem ligação direta aos surtos anteriores do Kasai (2007 e 2008/09). Os dados clínicos, laboratoriais e epidemiológicos apontam para que o caso índice corresponda a uma mulher grávida de 34 anos, falecida a 26 de agosto, e cujo funeral terá decorrido sem qualquer precaução relativa a medidas de segurança e de controlo de transmissão da infeção. De acordo com este relatório, os casos secundários terão sido verificados nos profissionais de saúde do hospital onde esta fora atendida. A resposta a este surto tem sido coordenada pelo INSP (Institut National de la Santé Publique) / COUSP (Centre des Opérations des Urgences de Santé Publique) da RDC, com o apoio técnico da OMS e de outros parceiros internacionais. Uma Equipa de Gestão de Incidente opera em Bulape com 64 peritos mobilizados (78% congoleses). Está ativado um laboratório móvel, na mesma região, desde 3 de setembro, de modo a facilitar a rápida análise das amostras testadas. Outras amostras também estão a ser enviadas para o centro do Institut National de Recherche Biomédicale (INRB), na capital do país, Kinshasa, para controlo da qualidade do próprio método de testagem. Também já foi destacada uma equipa responsável pela sequenciação genómica das amostras colhidas, no dia 24 de setembro. No hospital geral de Bulape, funciona, neste momento, um Centro de Tratamento de Ébola (CTE) com 34 camas (tendo sido registada uma ocupação, no internamento, de 100%, a 21 de setembro). Até 14 de setembro, 25 doentes receberam o anticorpo monoclonal mAb114, existindo provisão para mais 20 a 25 doses deste anticorpo. Campanha de Vacinação e Logística Paralelamente, foi desenhada uma campanha de vacinação, reativa ao surto, na província de Kasai, com um acervo de cerca de 46.000 doses da vacina Ervebo, eficaz e segura contra o vírus da Ébola. Esta campanha foi implementada a 13 de setembro com recurso a uma estratégia “em anel”, que consiste em imunizar os indivíduos com maior risco de contágio, após o contacto com doentes confirmados (até 21 de setembro: 1740 indivíduos já vacinados), complementada por uma abordagem direcionada em todos os hotspots onde foram confirmados casos. Esta dupla abordagem revela-se altamente dependente da capacidade de transporte e armazenamento de mais lotes da referida vacina. Uma avaliação inicial conduzida pela OMS África detetou lacunas críticas no cumprimento das medidas de prevenção e controlo de infeções (como a falta do recurso a equipamentos de proteção individual, a má gestão dos resíduos hospitalares, incluindo os biológicos) e na prestação direta de cuidados de saúde ou na aplicação das medidas de saúde pública (a incorreta triagem dos pacientes atendidos nos serviços de urgência, a aplicação ad hoc das definições de caso suspeito, provável e confirmado de Ébola). Paralelamente, a comunicação de risco e de envolvimento comunitário, tais como a realização de funerais seguros e dignos, a desinfeção dos domicílios dos indivíduos classificados como casos confirmados e a melhor manipulação dos resíduos médicos no CTE de Bulape foram intensificadas, decorrentes da identificação de um awareness reduzido e de uma elevada desconfiança dos profissionais para a importância destas medidas. Para garantir o abastecimento das devidas contramedidas médicas, a OMS, o Programa Alimentar Mundial e a MONUSCO (Mission de l'Organisation des Nations Unies pour la stabilisation en République démocratique du Congo) montaram uma ponte aérea temporária, por duas semanas, entre Kananga, Bulape e Mweka. Mais de 14 toneladas de material médico chegaram à zona afetada e um novo CTE com maior capacidade está em construção, na província. Avaliação de Risco A OMS classifica presentemente o surto como uma ameaça séria, dada a sustentada transmissão humano-humano, a elevada letalidade já registada e o risco de extensão geográfica do surto a outros centros urbanos, como Tshikapa e Kananga. No entanto, não se recomendam, neste momento, medidas de restrição ao tráfego internacional. As autoridades de saúde nacionais e dos países vizinhos da RDC estão a reforçar a vigilância e a comunicação do risco nos pontos de entrada/travessia e a coordenar, com a OIM, medidas de mitigação dos riscos transfronteiriços. A OMS avalia o risco na RDC como elevado, sendo considerado moderado a nível da Região Africana desta organização e baixo a nível global. Segundo o ECDC, o risco atual para cidadãos do espaço da UE/EEE que vivem ou viajam para a província do Kasai é considerado baixo e, para os cidadãos da UE/EEE que não se enquadram na categorização prévia, o risco é considerado muito baixo, dada a muito reduzida probabilidade de introdução e transmissão secundária dentro deste espaço geográfico. Em Portugal, considerando a avaliação de risco para a EU/EEE, há que ter em conta a baixa probabilidade de importação e de transmissão secundária. Contudo, a proximidade do epicentro deste surto a Angola, país com o qual os aeroportos portugueses têm um tráfego direto e intenso, contribui para elevar ligeiramente o risco de importação do vírus, por cadeias de transmissão transfronteiriças. Escrito por João Pinheiro
Revisto por Francisco Aparício e Cláudia Roseira
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