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Nome Francisca Pulido Valente Instituições, Cidade e País INSERM - EHESP École des Hautes Études En Santé Publique Rennes, França Como soubeste da existência desta vaga/ oportunidade? Foi durante o CESP, enquanto fazia um trabalho, que encontrei um artigo que mudou a minha forma de pensar e começou a “limitar” os tópicos que mais gosto de estudar e trabalhar em saúde pública: um artigo da Prof.ª Mélissa Mialon e da nossa colega Margarida Paixão sobre a atividade corporativa política da indústria do álcool em Portugal. Descobri um mundo novo — o dos determinantes comerciais de saúde — e o trabalho da Mélissa ficou-me na cabeça desde então. Caso tenha havido processo de candidatura, como foi? Procurei o LinkedIn da Mélissa (que é Inserm Chair on “Research on Health Services” e publicou centenas de artigos) porque queria aprender sobre determinantes comerciais da saúde. Enviei-lhe uma mensagem direta e sem rodeios: queria fazer um estágio com ela porque essa área ainda está em desenvolvimento em Portugal. A resposta foi rápida e generosa. Conversámos sobre o que faria sentido desenvolver juntas, alinhámos objetivos e depois esperei pelo processo formal da instituição francesa (INSERM/EHESP). Tive de assinar uma espécie de contrato, mas tudo correu com muito profissionalismo e abertura da parte deles. Como foi a adaptação a uma nova cidade? Foi surpreendentemente fácil. Falo francês — nasci em França — e isso ajudou imenso. Rennes é uma cidade maravilhosa, cheia de vida, com um mercado incrível, pequenos restaurantes com menus locais, livrarias, ruas antigas, estudantes por todo o lado e uma energia acolhedora. A comida era uma festa à parte: o queijo, os crepes… e claro, o maravilhoso caramel salé. Inicialmente fiquei nas residências do campus da EHESP, mas depois procurei a minha própria casa. Senti-me em casa muito rapidamente, também graças às pessoas que me acolheram. Como era o ambiente no local de trabalho? Havia uma enorme generosidade, alegria e evolução intelectual. Trabalhava com pessoas de vários países — México, Colômbia, Canadá, Senegal — e havia sempre espaço para discussão crítica, perguntas difíceis e partilha de experiências. A Mélissa é uma líder inspiradora: exigente, mas humana, e sempre com um sentido de justiça muito claro. A equipa era superdivertida e, além do trabalho, almoçávamos quase sempre juntos. Ria-me muito e falávamos em várias línguas, mas entendíamo-nos perfeitamente. Como era uma semana habitual tua? Quais foram as tuas funções exatas? As semanas eram muito variadas. Tinha dois projetos principais, dois futuros estudos para publicar: um com recolha documental e análise temática, e outro que envolvia a construção de um questionário. Também participei em reuniões, conheci vários investigadores, assisti a aulas do mestrado de saúde pública dadas pela Mélissa (onde participei em discussões de grupo com alunos, facilitei aulas e participei na avaliação de estudantes). Tivemos atividades diversas como visitas a comunidades e ONGs locais. Fiz um período em Lisboa para participar em duas conferências (uma delas com a Mélissa). Lecionei uma aula no CESP–NOVA sobre determinantes comerciais da saúde, usando tudo o que tinha aprendido ali. A semana também incluía passeios com baguetes acabadas de comprar nas maravilhosas padarias (barradas com manteiga incrível), ouvir música francesa de Natal na cozinha (vivia mesmo no centro e a música entrava pela casa), fazer jantares com colegas, e receber os meus amigos, namorado e família… Aproveitei para visitar a Bretanha — fui ao Mont-Saint- Michel, por exemplo. E num sábado fomos com a Mélissa a Paris para uma reunião com uma organização. Havia uma sensação constante de estar a viver algo que era mais do que trabalho: era um mergulho total numa outra forma de estar — à maneira dos bretões. O que mais te marcou? A primeira aula da Mélissa. A Mélissa falou de justiça social, da importância das palavras certas, do véu da ignorância, do modelo da moeda de Rawls. Parecia que tudo encaixava e ao mesmo tempo desmontava formas antigas de pensar. Nunca tinha olhado para a saúde pública com aquela abrangência. Também me marcou muito a relação com a equipa: acolheram-me, ensinaram-me, desafiaram-me. Fiquei uma semana em casa de uma colega — dormi lá, partilhámos tudo. Cozinhou para mim e tratou-me como família. E o último retiro de escrita que fizemos todos juntos foi muito especial. Quais as maiores aprendizagens? Aprendi a identificar as estratégias das várias indústrias para influenciarem políticas e ciência, saí claramente do meu tópico de eleição, que é realmente o álcool. Aprendi ferramentas concretas para investigar essas práticas no meu país. E aprendi que não estamos sós — há pessoas por todo o mundo a trabalhar com coragem e rigor para mudar sistemas profundamente enraizados. E finalmente, aprendi a sair da minha bolha. Farias alguma coisa de forma diferente? Sim: teria ficado mais tempo. Senti que estava no sítio certo. Teria prolongado o estágio. Teria tentado garantir uma bolsa, porque o preço do alojamento foi elevado, ou procurado alternativas mais baratas. Mas admito que não fiz qualquer poupança porque queria aproveitar tudo o que podia. Valeu cada euro. Que conselhos darias a quem gostasse de ter uma experiência de estágio semelhante? Não esperes por convites formais. Vai atrás das pessoas cujo trabalho te inspira. Sê claro nos teus objetivos, mas flexível no caminho. E, se possível, prepara-te financeiramente para conseguires aproveitar a experiência com tranquilidade. Ah — e mergulha de cabeça. O conhecimento técnico é importante, mas o que mais fica são as pessoas e o crescimento interno.
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